quarta-feira, 15 de fevereiro de 2012

DIOGO CÃO . Sou vilarealense


DIOGO  CÃO:  Sou  vilarealense

Nasci  aqui em Vila Real de Trás-os-Montes, sou filho de Pedro Afonso Cão, magistrado e administrador civil nomeado por D. Dinis, o rei troveiro, fundador da Vila.
Ainda hoje podeis encontrar e visitar a minha casa na parte histórica.

Sempre adorei os rios, aprendi a nadar na Ínsua, uma pequena ilhota na confluência dos rios Corgo e Cabril,  pratiquei mergulho ao saltar a pino para o  Poço  Romão.

Brinquei na Rua do Jazigo ao cacholo, ao pião e ao panelo.

Na Rua de Trás dos Muros, já fora das muralhas, para termos mais espaço para as tropelias, com o bordão do Alleo, joguei à choca e à reca na companhia de Dom Pedro de Meneses.

Vi passar as procissões do “ Corpus Christi ” no Largo do Tabolado, organizadas pelos frades dos Conventos de S. Francisco e S. Domingos.

Alambarei-me com ganchas, cavacórios e bexigas.

Muito jovem ainda, tive que deixar os ares saudáveis da Serra do Marão e partir com destino a Lisboa para servir na Armada Real.

Fiz o caminho na companhia de experientes e simpáticos almocreves que zelaram pela minha segurança e conforto.
Nos primeiros anos na capital tive enormes saudades do pão de trigo, criado nos lameiros da Redonda, moído nos moínhos da Peneda e cozido nos fornos da Vila Velha ...  deliciosamente untado com mel de urze dos montes do Alvão.

Ao iniciar-me na vida de marinheiro, fiz várias viagens ao Golfo da Guiné.
 Sempre muito atento e observador, fui apontando todos os conhecimentos nos mapas e nas cartas náuticas.
Registei ventos e correntes marítmas. Tomei nota da profundidade das águas, fiz desenhos dos recortes da costa e dos encantos e recantos da paisagem.
Com a ajuda do astrolábio, do quadrante e do sextante, medi a altura dos astros, aprendi a determinar as coordenadas. 
Tracei novos rumos e novas rotas.

De regresso a Lisboa, ali na proa da Europa, durante oito anos, preparámos as  futuras expedições.

Nos estaleiros de Belém construímos novas caravelas, mais resistentes e velozes, com adaptações e transformações de equipamento, mastros, cordas e velames, para conseguirmos enfrentar o rigoroso Oceano Atlântico, abandonando a navegação de cabotagem, à vista da costa, por uma rota de mar alto ... guiados agora pelos astros.

 A minha ousadia e  os meus conhecimentos, tornaram-me mais forte, mais seguro e mais pessoa.
Preparei-me para enfrentar os ventos que sopram vigorosamente, as tempestades e calmarias.
   Sentia-me agora,  capaz de enfrentar e vencer os medos dos oceanos.

Assim, em 1482 consegui concretizar o meu sonho de grande velejador.

Foram estas qualidades e capacidades comprovadas que levaram  D. João II, o Príncipe Perfeito, a atribuír-me a capitania da Armada para navegar a costa ocidental da África para Sul, comandando uma tripulação por mares nunca dantes navegados, com  firme propósito de encontrar o caminho para o oceano Índico dobrando o continente africano.

Missão que não consegui ... mas permiti que o meu companheiro Bartolomeu Dias o fizesse em 1487.

Fui o primeiro europeu a ultrapassar o Equador.
 Uma mudança histórica que se projectou no nosso futuro colectivo.

Até ao meu tempo os navegadores tinham por hábito deixar em terra uma cruz de madeira para assinalar as explorações que tinham feito, estas cruzes eram extremamente vulneráveis ao clima e às intempéries.

Eu, coloquei padrões de pedra que espalhei pela costa africana com os símbolos de Portugal, o que causou grande espanto aos nativos.

Estes padrões são marcos indeléveis de uma passagem e o testemunho do  domínio das gentes Lusitanas.

O primeiro padrão, dedicado a S. Jorge, mandei-o colocar na margem sul da foz do rio Zaire.
No Cabo de Sta Maria, coloquei o padrão de S. Agostinho e nele escrevi “Ano de 1482, o mui alto e mui poderoso príncepe, rei D. João II de Portugal, mandou descobrir estas terras e pôr estes padrões por Diogo Cão, escudeiro da sua casa”.

Todos os padrões que deixamos ao longo da costa, fizemos questão de assinalar nas cartas que íamos rectificando e completando.

Navegamos, sempre mais para sul,  ao encontro do Oceano Índico.

Convivi, pacificamente, com os povos do Congo e  de Angola. Partilhámos culturas e tradições. Trocámos prendas e o próprio rei prometeu converter-se ao Cristianismo.

Negociei com os povos de Benim.
 Estas gentes viram pela primeira vez soldados envergar uma armadura munidos de armas e arcabuzes.

Fiz escala na foz do rio Zaire, recebi a bordo vários negros que trouxe para Portugal e devolvi às suas gentes na viagem seguinte, muito bem vestidos e alimentados, maravilhados com o tratamento que tiveram no palácio Real.

 Enviei a terras emissários para conversarem com os reis locais para conhecerem a língua e observarem os seus costumes.

Neste rio, enquanto conseguimos navegar, subimos o seu percurso durante 150 km, até às Cataratas de Ielala.
Numa rocha da margem do rio, os meus homens gravaram uma cruz de Cristo,  o emblema das quinas e escreveram a seguinte frase :
Aqui chegaram os navios do esclarecido rei D. João, o segundo de Portugal”.

As minhas boas relações iniciadas com o rei do Congo, permitiram futuramente o estabelecimento de muitos portugueses nesta região da  misteriosa e longínqua  África, onde fizeram façanhas grandiosas.

Viajando sempre com destino ao sul, estive no Cabo Redondo,  na angra de Santa Maria e no Cabo Lobo.

 Aqui, resolvi dar a volta e regressar a Portugal, trazendo as notícias e a boa-nova ao rei D. João II, cheguei em Abril de 1484.

 Em 8 de Abril de 1484, o rei D, João II ficou tão contente com os resultados desta viagem, que ofereceu, a mim e aos meus filhos, uma tença de 10 mil reais por ter descoberto novas terras para além das partes da Guiné.

O monarca atribuiu-me também uma carta de brasão de armas e o título de fidalgo ... muito superior ao título de navegador, referindo:
 É obrigação dos príncipes ”dar honra aos que por virtudes e serviços o merecem”.

Em 1485 parti para nova expedição.
 Ultrapassei o Monte Negro e a serra Parda, aqui levantei um padrão de mármore com a bandeira de Portugal.

Naveguei mais mil milhas para sul, estávamos no ano de 1486 e nunca mais fui visto... desapareci na sombra.
O meu corpo nunca foi encontrado, mas ... a minha alma continuou a viajar pelo oceano e a acompanhar os portugueses, em especial os grandes acontecimentos ocorridos na minha terra natal e os feitos dos meus conterrâneos.
Por exemplo:
Em 1809
- Estive ao lado do General Silveira a lutar contra as tropas invasoras francesas do General Junot.

Em 1894
-Ajudei o alemão Biel, na central do Agueirinho, a ligar a luz eléctrica. Pela primeira vez uma urbe de Portugal teve as ruas iluminadas através de uma rede pública.





Em 1 Abril de 1906,
- Assisti, no Largo da Estação, ao grande acontecimento da chegada do comboio.
 Corri ao lado da máquina a vapor, no meio da multidão de gente que nunca tinha visto tal coisa.

Em 14 de Outubro de 1918
– Acompanhei, ao leme, o primeiro tenente Carvalho de Araújo a comandar o Caça Minas Augusto de Castilho no combate feroz contra o submarino Alemão U-139,  que se estava  a preparar para atacar o paquete S. Miguel, que navegava do Funchal para Ponte Delgada com 206 passageiros a bordo.

No dia 15 de Junho de 1931, nas Festas de Santo António.

 -  Na reta da meta, com Aureliano Barrigas, levantei a bandeira para dar a partida aos bólides do Circuito Internacional.

 Muito sensibilizado fiquei em 1955.
 Quando o município inaugurou num belo jardim da parte alta, da agora cidade, uma imponente estátua da minha pessoa, da autoria do escultor açoreano Canto da Maia, o grande escultor das estátuas dos heróicos navegadores portugueses.

Mas a grande honra da minha memória aconteceu em 1972.
Superior à tença de 10 mil reais e ao título de fidalgo que D. João II  me ofereceu.
Foi a atribuição do meu nome à Escola onde  estamos.

Uma escola representa a juventude, o conhecimento, o saber, a descoberta, o dar novos mundos ao mundo da criança.
Esta escola ao longo de quatro décadas, tal como eu fui,  é uma escola de causas, de ousadia, de inigualável espírito e sentido nacional, aberta a todos as comunidades.

Um espaço de cultura responsável e participada procurando mais excelência e mais cidadania.
 Hoje encontramos na escola alunos desde os 4 anos de idade até aos 70 anos dando resposta a jovens, pais e avós, posssibilitando a escolaridade e aprendizagens que todos têm direito.

Umbilicalmente ligada à escola encontramos a Associação Desportiva e Cultural que através da prática desportiva das modalidades de futebol e basquetebol, têm transportado pelo mundo os valores,  de uma mente sâ em corpo são.

Estou certo que as gerações que estão a usufruir deste investimento e esforço na educação hão-de retribuir com progresso e desenvolvimento para o país.

Eu, entre os Oceanos e os Astros, vou continuar atento ao vosso  risonho futuro.
Sejam audazes, por bem de Portugal.
Hilário Néry de Oliveira

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