quarta-feira, 15 de fevereiro de 2012

Festa de Santa Ana - Campeã


SANTA ANA

DÁ BRILHO À CAMPEÃ E  FELICIDADE  ÀS  SUAS  GENTES


Correcto e afirmativo, foi assim que o agente da GNR, em serviço num dos cruzamentos do percurso, respondeu às instruções do seu superior. Era necessário desimpedir a rua para passar a Majestosa Procissão de Santa Ana.
É sem dúvida o grande acontecimento anual das Terras do Vale, compostas pelas freguesias de Campeã; Vila Cova e Quintã.

Neste fim-de-semana a população triplica, chegam de toda a parte da Europa, milhares de filhos da terra que labutam no Luxemburgo; na França; na Suiça; na Bélgica; na Inglaterra; na Espanha e outros vindos do próprio país, em especial das regiões do Litoral, para onde migraram à procura de um nível de vida superior àquele que as  potencialidades maronesas lhes podia oferecer.

É o grande momento do encontro ou reencontro, do compartilhar emoções, tristezas e alegrias, do apresentar os novos elementos da família: mais um filho; mais um neto; um genro; uma nora. É o momento para iniciar, apalavrar ou concluir, negócios, compras, vendas, trocas, partilhas, etc.
É o momento de retomar relações sociais e fortalecer laços de amizade, lá vem o convite para uma visita, um copo, uma ida à adega provar o presunto, que desde o Inverno aguardava por este destino no gancho da salgadeira, ou degustar os salpicões para ver se ainda mantêm o sabor e os temperos dos velhos tempos das avós.

Santa Ana, a avozinha de todos nós, brilha e faz brilhar em especial a Campeã e as suas gentes, aumenta-lhes a felicidade, reforça-lhes o ego, mantém-nos unidos ao rincão Natal. Santa Ana é o argumento único que consegue plasmar e fazer prevalecer todas as razões porque estes povos regressam com alegria, ternura e por vezes com sacrifício à sua terra e lhes redobra as energias e a vontade para regressarem, obrigatoriamente, no próximo ano.

Santa Ana, esposa de S. Joaquim, mãe de Maria e avó de Jesus Cristo, é o símbolo esplendoroso de uma sociedade matriarcal onde todos nos revemos, em especial os povos e as gentes através de afinidades culturais, humanas e climáticas que constituem este “Terroir”  da  Campeã, onde por força das necessidades os homens tiveram de partir em busca do sustento, enquanto as mulheres ficaram ao leme da família, por vezes comparada a uma grande nau à deriva nas águas revoltas e turbulentas  de uma  tempestade, procurando encontrar sobre a espuma  alva o rumo certo.

Cada ano que passa a Procissão cresce, ganha dimensão e qualidade, tanto no número de figurantes como na decoração dos andores, mas sobretudo na postura correcta, empenhada e digna daqueles que a corporizam: Os cavaleiros, a fanfarra, os escuteiros, as confrarias, os anjinhos, as bandas musicais, os acompanhantes.
Tudo sabiamente dirigido e orquestrado pelo Pároco Sr. Dr. Manuel Queirós. Uma força dinâmica da Natureza que Providencialmente foi colocada na freguesia, onde tem sabido lançar e fazer germinar as sementes que com maestria deita à terra.

Se o grande momento religioso das festas é a Procissão de Domingo, o grande cartaz etnográfico desenvolve-se no Sábado, com um programa diversificado de actividades, com realce para a Feira do gado, sobretudo com a atribuição dos prémios da Raça Maronesa.

Dezenas de juntas de bois e vacas são colocadas a concurso, todas vistosas e imponentes, bem ataviadas, limpas e escovadas com peles lustrosas, ornamentadas com garridas fitas encarnadas e sonoros colares de chocalhos.
Levar o gado ao concurso e ganhar o prémio é o corolário de um ano de trabalho e de canseiras. O resultado de um tratamento sábio e de uma alimentação cuidada e reforçada, é o brio de toda a família ali representado.
É uma alegria imensurável receber a Taça das mãos do Senhor Presidente da Junta de Freguesia e do Senhor Presidente da Junta de Agricultores, que no cimo de um palanque as entregam como reconhecimento das qualidades dos animais autóctones.

Que bonito é ver estas duas entidades de mãos dadas em prol de uma causa comum. Bom seria que assim fosse para todos os grandes projectos e desígnios futuros da freguesia, que acima das diferentes cores estivesse sempre o progresso, a afirmação e o desenvolvimento da terra como único objectivo.

Terminado o prémio do Maronês, segue-se a tradicional corrida de cavalos em Passo-travado. Este ano inaugurou-se uma nova pista, mais ampla e com melhores condições sobretudo para espectadores e cavaleiros. Foram muitos os que nos visitaram, bem apetrechados com montadas de superior qualidade que entusiasmaram toda a assistência espalhada ao longo das margens sobre os muros de xisto dos lameiros verdejantes.

Mas o Sábado de festa só termina depois de uma volta completa pelos restaurantes da terra. É obrigatório provar o cabrito assado do Restaurante Amaro, as deliciosas tripas do Restaurante Alberto da Feira e, a chanfana de cabra do Restaurante Zézita, que a mãe D. Cidália, nos meados do Séc. passado, trouxe das encostas do Rio Mondego, para as cercanias da Serra do Marão.
Tudo como na infância, quando me diziam: “Hoje, excepcionalmente, podes comer o cabrito com as mãos, mas a seguir tens que ir a correr lavá-las à Fonte da Venda, para depois irmos às tendeiras comprar o brinquedo, prenda da Festa”.
Já sabia que vinha mais uma bola, pois a automaca vermelha de folha de Flandres e a espingarda de madeira de carregar pela boca, seriam sempre censuradas.
A primeira pela cor, a segunda pelo combate à agressividade.



Hilário Néry de Oliveira, Professor de História


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